182. «ANA» - Crítica de Eduardo Prado Coelho
[Estreia no Forum Picoas, Lisboa - 6 de Maio de 1985]
ANA
de António Reis e Margarida Cordeiro
Ana significa harmonia, mas também cisão, distância insuturável do mesmo ao mesmo. E, por isso, necessidade de transporte para cobrir todas as distâncias. A conversa sobre barcas tem essa função: abrir um fundo metafórico sem contornos precisos - na medida em que, utilizando-se a metáfora do transporte, se deve ter em conta que o transporte é a essência da própria metáfora. Ana é, por um lado, um cosmos; mas é, ao mesmo tempo, o caos. A origem não é apenas harmonia, mas vento demencial. O sono não é apenas repouso, mas queda e confusão. O leite converte-se em sangue (são os dois pólos que sustentam o filme). Estamos, como diria Rilke, perante o «círculo da evolução total» - o que é indiscritível: «Mas isto: conter a morte, / a morte toda, ainda antes da vida / tão docemente contê-la e não ser mau, / isto é indescritível». Ou, se preferirem isto é Ana.
Eduardo Prado Coelho
Jornal Expresso, Revista-Cartaz, pág. 4-R, de 8 de Junho de 1985.