190. ANTÓNIO REIS - Postura cívica
O CASO DOS 5 REALIZADORES DESPEDIDOS
No dia 20 do passado mês de Abril, João Lima, secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e Emigração, após um visionamento sumário da cópia de montagem do filme "Lisboa, 1.ª Página", resolveu ordenar diversos cortes, supressões e alterações, quer da banda de imagem, quer da banda do som. Pedro Amorim, José Bogalheiro, Rosa Coutinho Cabral, José Alves Pereira e José Lã Correia, autores do referido filme, recusaram-se a fazer as alterações ordenadas, já que, no seu entender, essas alterações iriam deturpar completamente o projecto inicial do filme (que havia sido anteriormente aprovado pelo secretário de Estado) e representavam uma ingerência intolerável na liberdade de expressão artística e uma violação dos direitos de autor.
Na sequência desta recusa, o dr. João Lima, procedeu ao despedimento dos cinco autores do filme.
Hoje, mais do que o relato dos acontecimentos, por várias vezes focados na Imprensa, interessa-nos a opinião polémica e o debate de ideias sobre este caso que, de forma alguma, se encontra concluído.
Um acto condenável
sob todos os aspectos
por António Reis*
Ao despedir, com uma "Shifer" (marca de caneta) os autores de "Lisboa 1.ª Página", penso que o dr. João Lima cometeu um acto condenável sob todos os aspectos. Precisará o seu Ministério, para subsistir, de mais emigrantes? Ou joga já com o desemprego para ter servos de confiança?
As vítimas de políticos prepotentes foram constituindo um povo marginalizado, lançado - pela borda fora - gota a gota, em torrente - a diáspora não é uma fatalidade lusíada: explica-se pelo fascismo.
Qual será a cultura cinematográfica do dr. Lima para não ter percebido o que pode afinal ser moeda corrente de expressão em cinema?
Outra pergunta: o dr. Lima, zeloso tecnocrata, censura alguns dos ignóbeis filmes que exporta para os emigrantes? Importa-se, porventura, do que representam e da alienação que disseminam? Ou convém-lhe a droga dessas imbecilidades para que os emigrantes não retirem o lastro ao barco com o qual lhe garantem o seu ordenado e o seu posto, que não é o de tarefeiro?
E é preciso que aqui fique, incontroversamente testemunhado: cinco dos camaradas despedidos, por brio picado, não têm, de facto, outras ocupações: têm sim, dr. Lima, dramáticas preocupações... históricas, por exemplo, económicas, culturais, portuguesas.
Um castigozinho para o dr. Lima: 8 dias apenas na Renault, na produção em cadeia...
Para um tecnocrata, é suficiente a lição.
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* Cineasta, professor da Escola Superior de Cinema
Boletim da FAPIR (Frente dos Artistas Populares e Intelectuais Revolucionários), N.º 7, pág. 15, Ano II, Junho/Julho de 1978.
AGRADECIMENTO: Obrigado Professor José Alves Pereira por nos ter enviado este texto e nos dar a conhecer uma outra faceta de António Reis.
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